Com o tema “O papel da sociedade civil diante dos desastres climáticos”, organizações parceiras de Pão para o Mundo (PPM) e Misereor no Brasil se reuniram hoje em um importante encontro de articulação e diálogo. O evento, promovido pela ELO Ligação e Organização e pelo CAIS – Centro de Assessoria e apoio a iniciativas sociais, reuniu representantes da sociedade civil, da cooperação internacional e do governo federal. Os participantes enfatizam a necessidade de incidir em políticas públicas, legislações e visões de mundo, além de fortalecer a comunicação e o enfrentamento ao negacionismo. Candice informa sobre um projeto de lei em andamento e a importância da participação da sociedade civil nesse processo, enquanto os organizadores prometem sistematizar e compartilhar as contribuições, anunciando futuros encontros para continuar o debate.
A abertura foi conduzida por Camila Veiga, coordenadora executiva da ELO, que destacou a urgência de colocar as organizações da sociedade civil (OSCs) no centro dos debates e das respostas frente às crises climáticas. Camila reforçou que as OSCs são fundamentais não apenas na resposta emergencial, mas também na construção de soluções estruturantes e de longo prazo, defendendo que sejam respeitadas e reconhecidas pelo trabalho que desenvolvem, com respaldo técnico, social e político nos territórios onde atuam.
O encontro foi marcado por três intervenções centrais, que trouxeram olhares complementares a partir da atuação em diferentes esferas: território, sociedade civil organizada e gestão pública.
Angelique Van Zeeland, coordenadora do Programa de Pequenos Projetos da Fundação Luterana de Diaconia (FLD), apresentou um relato direto da atuação no Rio Grande do Sul, estado que enfrenta uma das maiores tragédias climáticas de sua história, com mais de 2,5 milhões de pessoas afetadas em 475 municípios e dezenas de milhares de desabrigados após a grande enchente de maio de 2024. Angelique destacou que a resposta emergencial é fundamental, mas alertou para a necessidade de continuidade nas ações, com fortalecimento das redes comunitárias, apoio às organizações locais e investimentos que garantam resiliência das populações mais vulneráveis diante das mudanças climáticas.
Na mesma direção, Carla de Carvalho, coordenadora do Centro de Defesa dos Direitos Humanos de Petrópolis (CDDH), compartilhou a experiência da Região Serrana do Rio de Janeiro, historicamente marcada por tragédias decorrentes de enchentes e deslizamentos. Carla alertou que a crise climática vem se agravando em territórios que já acumulam desigualdades históricas, e reforçou que a atuação das OSCs é fundamental tanto na defesa dos direitos das populações atingidas quanto na construção de soluções de prevenção, gestão de risco e fortalecimento comunitário.
O papel do governo e os desafios regulatórios
Por parte do governo, Igor Ferreira, diretor de Parcerias com a Sociedade Civil da Secretaria-Geral da Presidência da República e presidente do Conselho Nacional de Fomento e Colaboração (ConfoCo), trouxe uma análise sobre os desafios institucionais e legais que dificultam a atuação ágil das OSCs em contextos de calamidade. Igor destacou que situações como as enchentes no Sul e a crise hídrica na Amazônia e no Nordeste evidenciaram lacunas no marco legal das parcerias com as OSCs em situações de emergência.
Para enfrentar essas lacunas, foi apresentado o Projeto de Lei 1707/2025, que tramita em regime de urgência na Câmara dos Deputados, propondo atualizar o Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil (MROSC) para contextos de desastre. O PL cria mecanismos para flexibilizar exigências, garantir segurança jurídica e viabilizar repasses emergenciais, além de possibilitar alterações nos objetos dos termos de parceria quando eventos de calamidade impedem sua execução regular.
Os dados apresentados nos diálogos entre Angelique, Carla e Igor convergiram na constatação de que os desafios climáticos não são episódicos, mas estruturais e permanentes, e exigem respostas integradas entre sociedade civil, governo e cooperação internacional. As três intervenções apontaram para a urgência de fortalecer redes, garantir financiamento contínuo, aperfeiçoar os marcos legais e construir políticas públicas capazes de prevenir, mitigar e responder aos impactos da crise climática sobre as populações mais vulneráveis.
Após um breve debate e uma divisão em grupos menores sobre os desafios e estratégias, a discussão no grupo ampliado trouxe destaques que reforçam o fato de que as organizações da sociedade civil precisam ser respeitadas pelo trabalho qualificado e legítimo que desenvolvem, especialmente nos territórios mais impactados. A atuação das OSCs não pode ser vista como algo acessório, mas sim como componente estruturante das políticas de gestão de riscos e resposta a desastres. O fortalecimento das redes e o financiamento contínuo são desafios centrais para garantir respostas eficazes, sustentáveis e baseadas na experiência acumulada pelas organizações nos territórios.
Adriano Martins, coordenador do CAIS, concluiu o evento com um chamado coletivo à ação: é preciso consolidar estratégias de fortalecimento das redes, garantir apoio continuado às organizações e assegurar que a sociedade civil tenha protagonismo e voz nas respostas à crise climática e na construção de justiça socioambiental no Brasil.
Nesse sentido, os participantes destacaram a importância de acompanhar de perto e fortalecer a tramitação do PL 1707/2025, que representa uma resposta concreta às demandas históricas das OSCs em situações de emergência. A mobilização da sociedade civil em torno do projeto é fundamental para garantir que o texto final do PL reflita as necessidades reais dos territórios e das organizações que atuam na linha de frente dos desastres climáticos, assegurando segurança jurídica, agilidade nas respostas e fortalecimento das ações coletivas em defesa das populações mais vulneráveis.