Por Morgana Damásio
Nesta quinta-feira, 28, o ELO Ligação e Organização e o Centro de Assessoria e Apoio a Iniciativas Sociais (CAIS) realizaram o webinário “Eleições e Fake News: o desafio para as OSC”. A ação, apoiada por MISEREOR e Pão Para o Mundo (PPM), é a primeira de três atividades previstas entre os meses de abril e maio que propõem a reflexão sobre o papel das Organizações da Sociedade Civil (OSC) no enfrentamento à disseminação de notícias falsas e o fortalecimento de estratégias de enfrentamento para este cenário, como a construção e disputa de narrativas.
“A gente não pode assistir passivamente mais uma vez um processo eleitoral desleal. As organizações podem ser agentes de disseminação de informações verdadeiras para apoiar a população nesse processo eleitoral”, afirmou Camila Veiga, coordenação executiva do ELO, durante a abertura do evento.
O webinário, também disponibilizado na íntegra no Youtube, contou com a facilitação de Magali do Nascimento, jornalista, doutora em ciências da comunicação e pesquisadora do Instituto de Estudos da Religião e Sérgio Amadeu, doutor em ciência política, professor, pesquisador de redes digitais e das implicações da inteligência artificial e apresentador do podcast tecnopolítica. A mediação foi feita por Silvio Caccia, diretor do jornal Le Monde Diplomatique Brasil e presidente do conselho da Action Aid Brasil.
Magali trouxe em sua fala um panorama sobre a desinformação, destacando quatro importantes categorias que constituem esse fenômeno: as notícias falsas (fake news), enganosas, inconclusivas e imprecisas. A jornalista também discorreu sobre os efeitos da desinformação nas últimas eleições presidenciais e traçou projeções para o próximo pleito, a partir da análise de pesquisas.
O que impulsiona a atração por notícias falsas? Segundo a estudiosa, fatores como a sobrecarga de informação no ecossistema digital tem provocado esgotamento e propiciado atalhos psicológicos fáceis e respostas emocionais com sentido menos crítico a conteúdos que se alinham a crenças e ao sentimento de moralidade ressentida. A ênfase na repetição também é um fator que pode dar credibilidade ao conteúdo e pessoas com perfis mais conservadores tendem a assimilar e compartilhar esse tipo de conteúdo, sobretudo pelo WhatsApp.
Nas eleições presidenciais de 2018 éramos 120 milhões de usuários ativos no WhatsApp no Brasil, 66% dos eleitores faziam uso da ferramenta. Para Magali, um cenário marcado pela “explosão de desinformação, imagens fora de contexto, áudios com teorias conspiratórias, fotos manipuladas, pesquisas falsas, ataques a imprensa tradicional, como capas falsas de revista e “checagem’’ de notícias que eram verdadeiras imagens que fomentam o ódio Lgbtqi+ e ao feminismo, guerra cultural com ataques contra artistas, áudios e vídeos de fonte comum ou de gente que se passa por gente comum, mas com identidade desconhecida, dando motivos para votar em um candidato”, destaca.
Os/as evangélicos/as representam uma parcela significativa do eleitorado que elegeu o atual presidente. Segundo pesquisa realizada pelo Avaaz, 98,21% dos eleitores de Jair Bolsonaro foram expostos a uma ou mais notícias falsas durante a eleição e 89,77% acreditam que os fatos eram reais.
A jornalista, que também é ativista do movimento ecumênico e colaboradora do Conselho Mundial de Igrejas, trouxe dados importantes da pesquisa “Caminhos da desinformação: evangélicos, fake news e WhatsApp no brasil”, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), que apontam que 61,9% dos/as evangélicos/as entrevistados/as indicam a política como temática recorrente de desinformação no WhatsApp, 13,2 % reconhecem pastores e irmãos da igreja como fonte mais confiável de notícias, 23,6% não checam as notícias que recebem no WhatsApp e 29,7% reconhecem a partilha de notícias falsas. “As esquerdas que estão buscando dialogar com os evangélicos estão fazendo isso pela lógica do conservadorismo evangélico. Estão atuando com a lógica dos Malafaias, Felicianos, Damares, buscando responder essas pessoas e eles não representam o universo evangélico múltiplo, plural, que a gente tem no Brasil. São figuras influentes, mas não são o retrato dessa pluralidade”, alertou, apontando que o perfil desta categoria é composto majoritariamente por mulheres de periferia, negras e na faixa etária entre 18 e 45 anos.
Como tendências para as eleições deste ano, Magali aponta o uso de ideias infundadas já utilizadas na disputa anterior, como o endossamento da “ideologia de gênero” (com o objetivo de salvar a “família tradicional”), “cristofobia” (perseguição a cristãos por governos de esquerda), insegurança das urnas eletrônicas e golpe, além da tentativa de fortalecimento dos feitos do governo, da imagem de Jair Bolsonaro como liderança de propósito nobre e a destruição da imagem de opositores.
Sérgio Amadeu deu sequência ao debate explicando como as fake news se disseminam no ambiente virtual. “70% dos conteúdos assistidos são fruto de recomendações dos algoritmos, são eles quem decidem o que e quem será popular ou não”, explica, destacando que as plataformas priorizam a recomendação de conteúdos impulsionados, pagos para serem distribuídos a um número maior de pessoas.
O investimento financeiro nas fake news é um importante fator para sua disseminação. Grupos políticos e econômicos se articulam para realização de disparos massivos das informações falsas por meio de tecnologia artificial, perfis falsos e bots, “robôs” que imitam o comportamento do usuário humano e são automatizados para emitirem mensagens.
OCUPANDO AS REDES – “Nós precisamos ter coletivos digitais, produzir conteúdos desmentindo informações. Nós precisamos criar um problema para os desinformadores”. A partir dessa fala, Amadeu aponta iniciativas importantes que podem ser adotadas para o combate à desinformação, como a criação de coletivos digitais que mobilizem pessoas para construção de estratégias semanais de produção de conteúdo. Ele sinaliza que podem ser 3,4,5 ou mais pessoas, o importante é dar início a ação.
No Youtube, o especialista recomenda a realização de lives e produção diária de vídeos curtos, se possível referendado com materiais comprobatórios ( prints de jornais, cortes de vídeos, etc) e usando hashtags. É importante que no começo de cada vídeo seja estimulado que os espectadores assinem o canal e ativem as notificações e que inicialmente os grupos assegurem que amigos/as curtam os vídeos, vale mandar um WhatsApp lembrando.
Para o Facebook a dica é mapear as páginas e perfis dos grupos aliados, independentes e adversários. Estruturar a relação dos perfis que poderão reproduzir as mensagens centralizadas e específicas da campanha local.
Já no Tik-Tok a orientação é a criação de um estilo coletivo, com publicação de dois a três conteúdos diariamente contra a desinformação, combinando imagem, prints, trechos de vídeos e uso de hashtags.
Sobre o WhatsApp, destaca que o bolsonarismo utiliza seus empresários e apoio internacional para realizar disparos massivos de desinformação, convocação e discurso de ódio segmentado. É importante que esses grupos públicos sejam mapeados e bombardeados com o desmascaramento dos conteúdos falsos.
OFICINAS – Dando segmento as ações formativas sobre o tema, no dia 19/5, das 14h às 18h, será realizada a oficina Mapeando e Fortalecendo: Estratégias de combate as fake news. Já no dia 27/05, das 9h às 13h, acontece a oficina Construindo mensagens e narrativas. As informações sobre as inscrições serão divulgadas em breve no portal e redes sociais do ELO.
O webinário contou com a participação ao vivo de mais de 60 membros de OSC, que puderam interagir com os facilitadores. O conteúdo segue disponível no Youtube:
Webinário “Eleições e Fake News: o desafios para as OSC” – YouTube
Uma resposta
Excelente evento! 👏🏽